Pessach 5782 / 2022

14 de abril de 2022


“E este dia será para vós por lembrança, e o celebrareis como uma festa do Eterno por vossas gerações; como um estatuto perpétuo o celebrareis.”
 (Êxodo 12:14)

Ano após ano, nesta mesma época, lembramos a emocionante história de Pessach, guarnecida por efeitos especiais num cenário repleto de simbolismos, os quais trazemos ao centro da mesa, para celebrar a nossa liberdade.

Nesta longa refeição, cada alimento traz sensações que despertam nossa memória coletiva. As canções, na primeira pessoa do plural –  Avadim hainu  (Fomos escravos), Dayenu (Nos bastaria), entre outras – não apenas nos embalam em coro com os demais participantes, como também nos transportam ao passado nos convidando a encarar um deserto árido e atravessar o mar para, enfim, viver em liberdade. Como comenta o professor Yosef Hayim Yerushalmi em seu livro Zachor, a memória é essencial para a prática judaica. Em Pessach, todos os elementos indicam que o que foi subitamente traçado no passado não foi uma série de fatos a serem contemplados a distância, mas uma série de situações que poderiam nos preencher existencialmente. Para ele a memória aqui não é mais uma simples rememoração que ainda preserva uma sensação de distância, e sim, reatualização. Todo o Seder é uma representação simbólica de um cenário histórico para que cada um de nós se sinta como se estivesse saindo do Egito.

Moshé é o protagonista desta saga. É o grande líder para a tradição judaica. O que torna a liderança de um humilde pastor de ovelhas tão potente e realizadora? Ele desafia o coração duro do Faraó e conduz seu povo em direção à liberdade e, finalmente, a Israel, destino que ele próprio não alcança. Mas Moshé não estava sozinho. Para que pudesse chegar lá no palácio do Faraó e exigir a liberdade do povo, muita gente precisou agir e se arriscar. A começar por Iochevet, sua mãe, e Miriam, sua irmã. O Faraó mandara matar todo hebreu recém-nascido. Iochevet e Miriam não o entregaram, esconderam-no por três meses, mas sabendo da impossibilidade de mantê-lo por mais tempo, colocaram-no dentro do rio Nilo na esperança de alguém se apiedar e decidir cuidar do menino. Só deu certo porque uma outra mulher, a filha do Faraó, viu o cesto no rio e o pegou para cuidar, mesmo sabendo que o bebê era hebreu. Há também a história das duas parteiras que foram chamadas para cumprir a ordem de Faraó, Puá e Shifrá. Ambas corajosamente o desobedeceram, arriscando a própria vida. Disseram a Faraó que as hebreias eram sábias e pariam antes que elas chegassem a suas casas. A história destas cinco mulheres talvez fique ofuscada pela grandiosidade dos feitos de Moshé, mas cada uma teve um papel primordial não apenas para que Moshé sobrevivesse, mas demonstrando que o povo não estava totalmente subordinado aos desígnios do Faraó e encontravam maneiras de resistir.

O ritual de Pessach conduz, através dos passos da hagadá, à garantia da continuidade, valorizando e despertando nas crianças a habilidade de perguntar e questionar, nos mostrando que devemos colocar como nossa maior prioridade educar nossas crianças para se tornarem novas lideranças, para continuar e melhorar o mundo em que vivemos.

Num encontro entre pai e filha, Amos Oz e Fania Oz-Salzberger, apontam para a participação das crianças como o ponto alto do Seder de Pessach, representando a vitalidade judaica:

“De todas as perguntas, a mais aguardada é a indagação intergeracional que assegura a passagem da tocha. “E quando amanhã o teu filho te perguntar: quais são os testemunhos e os estatutos e as leis que o Senhor nosso Deus te ordenou?”  Esta é a chave, a Pedra Filosofal Judaica. É o módulo pedagógico da memória, recuando até o berço nacional, o Livro do Êxodo. Por favor, Filho, pergunta a mim!”

Chag Pessach Sameach!